Organizações da sociedade civil se posicionam contrárias à aprovação do PL das eólicas offshore com a atual redação

Jabutis que favorecem a implantação de usinas termoelétricas, além de impactos nas comunidades pesqueiras e na biodiversidade marinha são as principais críticas ao PL

O Projeto de Lei (PL) 576/2021, atualmente em discussão no Senado, visa regulamentar a implantação de usinas eólicas offshore (no mar)no Brasil. Contudo, a proposta legislativa guarda em sua formulação final uma perigosa contradição, devido aos denominados “jabutis” e seus impactos significativos, que tem gerado uma série de críticas de organizações socioambientais e de movimentos da pesca artesanal, entre eles as organizações inseridas no GT Mar, coletivo da sociedade civil que integra a Frente Parlamentar Ambientalista da Câmara dos Deputados. O objetivo do grupo é evitar que o PL seja aprovado da maneira como está a redação atual.

Para as organizações inseridas no GT Mar, um dos principais problemas do PL 576/2021 é a inclusão de medidas que aumentam as emissões de gases de efeito estufa, pois favorecem a ampliação do uso de combustíveis fósseis, como carvão e gás natural. A inclusão desses temas durante a votação do PL na sua passagem pela Câmara dos Deputados, contradizem o objeto proposto pelo projeto de lei, que visa promover fontes renováveis, bem como o conceito de uma transição energética sustentável. Os ativistas acreditam que fomentar o carvão e o gás, que são fontes fósseis altamente poluentes – vai diretamente na contramão das ações globais de descarbonização e enfrentamento da crise climática, pois perpetua a dependência de recursos que contribuem significativamente para o aumento da temperatura do planeta e a degradação socioambiental.

“O envio de sinais contraditórios à sociedade, investidores e ao mercado global de renováveis mancha a imagem do país que pretende sediar a COP 30 em Belém e se converter em liderança global no enfrentamento às mudanças climáticas”, defende Soraya Tupinambá, que integra o GT Mar, grupo que está em mobilização para análise do PL.

As organizações também cobram que o PL das eólicas offshore explicite que o Planejamento Espacial Marinho (PEM) será adotado como um pré-requisito para a organização e uso sustentável dos espaços marítimos, garantindo que as atividades econômicas, sociais e ambientais possam coexistir de forma efetiva. “Sua adoção como pré-requisito obrigatório deve constar na lei para que a instalação de parques eólicos nos mares do Brasil seja precedida de um instrumento com capacidade para evitar conflitos sobre o uso das áreas marítimas e proteger tanto os ecossistemas marinhos-costeiros quanto às comunidades costeiras que dependem desses ambientes”, defende Tupinambá. De acordo com a Marinha Brasileira, está prevista para 2029 a conclusão do PEM no Brasil, o que coincide com o período de amadurecimento para instalação dos investimentos em eólicas offshore. “Não há razões práticas para que o PL não inclua o PEM como um instrumento prévio e obrigatório à instalação de eólicas no mar”, completa.

Impactos nas comunidades pesqueiras e na biodiversidade marinha.

Para o desenvolvimento da pesca artesanal, é necessário um ambiente marinho saudável, livre e acessível para garantir segurança alimentar e práticas comerciais. A introdução de atividades que possam ameaçar a integridade desses ambientes poderá prejudicar as condições de subsistência das comunidades pesqueiras e seus modos tradicionais de vida, além de potencialmente impactar a economia local, em desencontro às boas práticas do planejamento espacial marinho e do desenvolvimento sustentável.

A instalação de turbinas eólicas no mar acarretará na exclusão de áreas de produção pesqueira em um raio de até 500 metros no entorno de cada estrutura, de acordo com a CONVEMAR (Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar). As alterações de rotas de pesca e o efeito barreira ocasionados também representam fortes restrições à atividade pesqueira, em especial às frotas e embarcações à vela presentes no litoral do Nordeste brasileiro.

Um dos maiores desafios enfrentados pelas comunidades costeiras é a falta de consulta livre, prévia e informada, nos termos da Convenção nº 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), da qual o Brasil é signatário e que garante às comunidades tradicionais, a participação nos processos de planejamento e tomada de decisão sobre os Empreendimentos que são implantados nos seus territórios, o que inclui a instalação das usinas eólicas offshore. Frequentemente, populações tradicionais são excluídas das discussões e decisões que afetam diretamente seus modos de vida, o que vai contra os princípios de justiça climática e de equidade social, que as organizações do GT Mar defendem.

Justiça e Inclusão social na Transição energética

Apesar da necessária transição energética frente ao avanço das mudanças climáticas, a proposta também levanta questões sérias sobre a justiça e a inclusão social na transição energética. A transição para uma matriz energética mais sustentável deve conter em suas premissas, acima de tudo, o caráter justo, popular e descentralizado. Isto significa que a mudança deve beneficiar toda a população, respeitar os direitos e necessidades das comunidades tradicionais.. Em vez de priorizar investimentos em tecnologias que possam ter impactos prejudiciais, a ênfase deve recair em soluções que promovam o desenvolvimento econômico de forma equitativa e sustentável.

A proposta do GT Mar é que em vez de se concentrar apenas em atender à demanda global e gerar receitas de exportação, o Brasil implemente uma estratégia que promova o desenvolvimento sustentável interno, abordando as necessidades energéticas locais e assegurando benefícios diretos para a população e saúde do oceano, afirma Letícia Camargo, secretária executiva do GT Mar.

Para as organizações integrantes do GT Mar, o PL 576/2021 ainda precisa ser debatido com a sociedade civil e com as populações atingidas em maior profundidade e revisado para alinhar-se a uma transição energética que seja, de fato, sustentável e inclusiva. A incorporação de jabutis que favorecem o carvão e o gás, bem como o impacto negativo sobre as comunidades pesqueiras e a biodiversidade, são pontos críticos que devemser devidamente endereçados. Uma transição energética verdadeira deve respeitar os ecossistemas naturais e os povos e comunidades locais, promovendo uma mudança que seja justa, popular e centrada em valores socioambientais.

Sobre o GT Mar

O GT Mar é um Grupo de Trabalho vinculado à Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso Nacional, que discute e incide em temas relacionados à conservação e governança marinha. O grupo colabora com os parlamentares que integram a Frente, na análise e proposição de legislações relacionadas ao sistema costeiro e marinho e às populações tradicionais que dele vivem.

As organizações da sociedade civil que assinam esse Release, são:

– Grupo de Trabalho para Uso e Conservação Marinha da Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso Nacional – GT Mar
– Painel Brasileiro para o Futuro do Oceano – Painel Mar
– Instituto Linha D’Água
– Instituto Terramar
– WWF Brasil
– Greenpeace Brasil
– Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras – CPP
– Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais – MPP
– Articulação Povos de Luta do Ceará – ARPOLU
– Movimentos dos Atingidos pelas Renováveis – MAR
– Eco Maretório
– Grupo Ambientalista da Bahia – GAMBÁ
– Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental, Núcleo RN – FMCJS (RN)
– O Grupo de Trabalho do Clima da Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso Nacional – GT Clima

Para mais informações:

Letícia Camargo – Secretária Executiva do Grupo de Trabalho do Mar, GT Mar.
Tel.: (41) 9665-7783.

Carolina Cardoso – Secretária Executiva do Painel Brasileiro para o Futuro do Oceano, PainelMar.
Tel.: (24) 98108-9610.

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